Naquela manhã ela acordou decidida,
mas era um de-ci-di-da que incluía que a decisão de decidir sobre as decisões
dela era só dela: uma sensação boa, um pedacinho daquela paz que sempre quis.
Então, o que faria com aquela decisão
de decidir, já que era sábado, não tinha que trabalhar? Manicure, ler um livro,
comer algo deliciosamente bom e calórico, cinema?! Enquanto enumerava sua lista
de “TO DO”, pensou que ultimamente tinha sido uma mulher que preferiu o nada a
qualquer coisa, o zero ao risco do negativo, a sorrir amarelo a dizer dane-se.
Por tanto tempo, que olhou no relógio e sentiu que já era tempo de conviver com
aquela sensação, quase que surreal, de comer um pedaço de cheesecake com coca
zero deitada na cama e sujando não só a cama, como o pijama. Sujava-se muito
pouco. Ora, o que pensariam? Evitava até pedir macarrão al sugo junto com os
amigos.
Pronto, a decidida decidiu: ia
convidar todo mundo para comer macarrão. Lógico que pensariam que iria pedir,
como sempre, algo que não a constrangesse ou aos outros, mas cara, gritou bem
alto, eu faço isso há tantos anos! Pensando bem, desde que a mãe, quando ela
tinha 4 anos de idade, em sua santa inocência, viu-a pegando a comida com a mão
porque viu na TV crianças que faziam assim em uma aldeia e ríspida, disse:
-”sua menina nojenta e sem modos, use o garfo e a faca!”
Será que ela comia macarrão com
colher? Ela nunca viu! Freud, me explica?!
E ia convidar “ele”. Sim, ele e seus
olhos absurdamente azuis que pareciam voar para fora e dentro, dentro e fora
quando lhe dava as mãos e tudo o que ela mais queria era estar ao lado dele e
daquela paz que ela temia tanto de tão desacostumada. Ah, como queria macarrão
al sugo e ele.
Tuitou o recado do jantar. O mesmo
restaurante, mesmo horário: melhor não começar já assustando. 15 respostas
rápidas de Ipads, Ipods, Smartphones, Notebooks, PCs. Uma vida praticamente
Miojo, filosofou.
E vamos passar a fita para a frente,
por favor. Não, não, ela não ficou horas escolhendo o vestido, nem o sapato e
nem fez cara de desesperada em frente ao espelho. Esqueceram que ela era a
decidida?
O garçom chegou.
- Prontos para pedir?
Ela foi a primeira:
- Eu quero um belo prato de spaghetti
al sugo.
O mundo parou naquele momento e tal.
Entretanto, lenga-lengas geralmente são para livros que depois que viram
filmes, frequentemente são cortados porque um filme custa muitos milhões de dó…
euros, por assim dizer. Só um adendo: ele foi o único que delicadamente passou
sua mão invisível bem na sua nuca. Ninguém viu, mas ela sentiu e ele também. Ô
calor!
E o macarrão chegou: lambuzado, quase
que erótico, como se Like a Virgin tocasse ao fundo.
- Garçom, por favor, me traga uma
faca.
O garçom trouxe a faca e ela, naquele
momento, era grande, enorme, poderia matar 10 pessoas, mas só matou a fome
dela, do decote do seu vestido preto em V profundo e da toalha. Um batalhão,
praticamente!
A conta chegou. Geralmente rachavam,
mas não ia rachar nada. Rachar, sim, a cara daquelas caras de eu não acredito
que ela matou o macarrão, ok, mas rachar vinho espumante que ela não tomava,
nem pa… chega!
- Oh garçom, você cobra o meu
separado aqui ó ( e foi entregando o cartão 5 estrelas toda orgulhosa). Não
esquece de colocar uma boa gorjeta para ti, hein! Eu faço questão, já que eu é
que comi o macarrão do jeito que eu queria e não como os outros acham que eu
deveria e foi você quem trouxe a faca, AMIGÃO.
Ah, malandra! Então, era ela, ele e o macarrão:
como um abraço imensurável que inseparavelmente sela e… mela!